A Psicanálise nos contos de fadas
- Pedro Psicologias
- May 30, 2024
- 4 min read
Na obra "A Psicanálise dos Contos de Fadas", de Bruno Bettelheim, o infame psicanalista faz a análise de diversos contos infantis usando a teoria de Freud acerca do inconsciente. De facto, no conto que escolhemos, “A Branca de Neve” o autor aborda a famosa história numa perspetiva diferente da normal, abordando tópicos como a sexualidade, os diferentes estádios de desenvolvimento psicossexual da infância e o narcisismo.
RESUMO DO CONTO “A BRANCA DE NEVE”
Essencialmente, este conto narra a história de uma bela princesa chamada Branca de Neve, que vivia num reino distante. A sua madrasta, a Rainha Má, era extremamente vaidosa e possuía um espelho mágico que sempre dizia que ela era a mais bela de todas. Porém, um dia, o espelho revelou que Branca de Neve se tinha tornado a mais bela do reino. Enciumada e furiosa, a Rainha Má ordenou a um caçador que levasse Branca de Neve à floresta e a matasse.
No entanto, o caçador, comovido pela inocência e beleza da princesa, poupou a sua vida e disse-lhe para fugir. Branca de Neve correu pela floresta até encontrar uma cabana, onde viviam sete anões que trabalhavam numa mina. Os anões acolheram Branca de Neve, que passou a viver com eles e a cuidar da casa. Enquanto isso, a Rainha Má descobriu através do espelho que a princesa ainda estava viva. Furiosa, a Rainha disfarçou-se de uma velha bruxa e preparou uma maçã envenenada. Ela foi até à cabana dos anões e ofereceu a maçã à Branca de Neve, que, inocentemente, deu uma mordida e caiu num sono profundo, aparentando estar morta. Os anões, ao retornarem, encontraram Branca de Neve e ficaram desolados. Incapazes de enterrá-la, colocaram-na num caixão de vidro.
Anos passaram até que um príncipe, que já tinha ouvido falar da beleza de Branca de Neve, encontrou o caixão. Apaixonado, ele beijou-a, quebrando o feitiço e acordando-a do sono profundo. Deste modo, Branca de Neve e o príncipe casaram-se e viveram felizes para sempre. Por contraste, a Rainha Má, ao saber do casamento, foi consumida pela raiva e acabou destruída por sua própria maldade.
PERSPETIVA/INTERVENÇÃO DO AUTOR
No livro de Bruno Bettelheim, A Psicanálise dos contos de fada, este conto é trabalhado numa ótica psicanalítica, explorando em detalhe todos os pormenores do conto. Com efeito, conseguimos retirar que a história da Branca de Neve baseia-se em dois aspetos cruciais: Complexo de Édipo e narcisismo.
Em primeiro lugar, o autor defende a importância do Complexo de Édipo para o desenvolvimento do conto, na medida em que este é o fator motor da intriga. Efetivamente, no início da história percebemos que a Branca de Neve e a sua madrasta, a Rainha Má, estão a competir pela atenção do Rei. Isto acontece porque a criança, que começa a ação com 7 anos, começa a dirigir pulsões libidinosas, isto é, de carácter sexual, ao progenitor do sexo oposto, sentindo-se atraída pelo mesmo e desenvolvendo um sentimento de competição como progenitor do mesmo sexo. Esta relação de animosidade cria um mau ambiente na família e está na origem do abandono da criança por parte da Rainha Má. No entanto, esta situação não tomaria estas proporções caso a madrasta não fosse consumida pelo seu narcisismo exorbitante.
Com efeito, o narcisismo é outro aspeto que está na génese da intriga. De facto, este é o traço psicológico caracterizador da Rainha, pelo que esta superestima as suas características e exagera os seus feitos, exigindo uma admiração constante por parte de todos aqueles que a rodeiam. Deste modo, a personalidade da madrasta choca com as pulsões libidinosas da Branca de Neve, estabelecendo-se uma competição que nutre o ódio da madrasta pela criança. Além disso, narcisismo de Branca de Neve também é percetível quando ela cede duas vezes às seduções da rainha que propõe torná-la mais bonita, decisões que teriam consequências trágicas.
A QUE CORRESPONDE O ID, O EGO E O SUPEREGO?
Quanto às instâncias do psique, neste conto é possível identificar:
- Id: Pode ser representado tanto na facilidade com que a branca de neve caía nas tentações da rainha, tanto no narcisismo da rainha que se prende a ideias infantis de “ser a mais bela”, tentando sê-lo “à força toda”.
- Ego: Pode ser descrito pelo facto da Branca de Neve, à medida do tempo em que vai estando em contacto com os anões, vai cumprindo cada vez melhor os trabalhos dados por eles e compartilha bens, sendo isto um sinal de amadurecimento.
- Superego: Bruno Bettelheim diz que como Branca de Neve controla o que come e bebe e não se deita numa cama que não seja a sua, controlando assim os impulsos sexuais provenientes do Id, submete-se às exigências do superego.
REFLEXÃO FINAL E CONCLUSÃO
Em suma, acreditamos que esta obra explora de um modo incomum as mensagens ocultas dos contos de fada tradicionais. De início, ficámos um pouco surpreendidos com a forma como o autor analisava determinadas personagens da história, mas, à medida que fomos lendo, apercebemo-nos de que as ideias referidas tinham, de facto, um fundo de verdade. Desta forma, recomendamos a leitura desta obra a todas as pessoas mais curiosas e que desejam descobrir uma nova versão dos contos de fada que ouviam na sua infância.
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